FAO Fome no Mundo

sendo este um espaço que pretende tratar de espiritualidade, filosofia, religião e fé, - e principalmente de busca pela Verdade, - seria inevitável que este momento chegasse . O momento para abordar a pergunta mais difícil de todas as perguntas. Não há buscador da Verdade que não tenha se perdido nesse deserto terrível, e não uma vez, mas muitas. Um deserto de trevas que parece infinito, inescapável. Não há buscador que não tenha se sentido profundamente frustrado por não conseguir encontrar essa resposta. Nenhuma questão perturbou tantos, durante tanto tempo. Nenhum mistério suscitou tanta angústia. Nenhum outro pesadelo atormentou o sono de tantos, por tanto tempo. Nenhuma lacuna tão incômoda perturbou as consciências dos santos de maneira tão avassaladora. Foram (e continuam sendo) inúmeras tentativas de resposta. As maiores e mais brilhantes mentes de todos os tempos tentaram, fizeram o seu melhor, e não tiveram sucesso. A filosofia não foi capaz de resolver este enigma. Nem os livros sagrados (estou falando de todos os livros sagrados) e nem mesmo a santidade mais luminosa foi capaz de fornecer à humanidade inquieta uma resposta definitiva, - direta e reconfortante, - à pergunta mais difícil de todas as perguntas.
Por que existe o sofrimento? Se Deus é bom e perfeito, por que criou um mundo mau e imperfeito? Se Deus é Amor, por que permite que soframos? Por que existe o mal? Como podemos ser maus, se Deus, sendo infinitamente bom, nos criou à sua imagem e semelhança? Se Deus é bom, onipotente e onipresente, como podem existir o mal e o sofrimento? Entre as inúmeras tentativas de resposta que os inúmeros sábios, religiões e filosofias trouxeram, - todas imperfeitas, - uma em particular me vem à mente, principalmente por ser sempre defendida por um leitor deste blog que eu considero um amigo. Essa resposta-padrão, adotada entre outros pela filosofia Seicho-No-Ie, seria mais ou menos a seguinte: “O mal e o sofrimento não existem. São apenas ilusões da mente, apegada à ilusão do mundo fenomênico.
Crianças suplicam pela vida nas ruas de Uganda. Outras imagens de agências internacionais mostram crianças com os rostos enfiados nos ânus de vacas, numa busca desesperada por qualquer fonte de nutrientes.
Se despertarmos da ilusão dos sentidos para a realidade maravilhosa do Mundo Verdadeiro, isto é, o Reino de Deus, veremos que tudo que realmente existe é perfeição e plenitude. Assim, não precisamos 'buscar' absolutamente nada. Tudo já é perfeito e divino do jeito que é. O mal, a dor, o sofrimento, as injustiças... Tudo isso não existe realmente. A Verdade é uma só, e a Verdade apenas É. Em última análise, portanto, não é preciso buscar explicações para o mal e o sofrimento, porque essas coisas simplesmente não existem”. Embora eu tenha combatido essa visão das coisas por aqui, por mais contraditório que possa parecer, num nível profundamente íntimo e inexplicável, eu sempre acreditei nisso tudo. Difícil entender? Bem, eu sempre acreditei no Reino de Deus como uma Realidade separada do nosso mundo ordinário; obviamente sempre acreditei que nessa realidade não existem o mal e o sofrimento, e que essa realidade, mesmo separada deste mundo de dores, deve ser vivida já, imediatamente, a partir daqui e de agora. Mas de modo algum eu poderia dizer que ‘o mal não existe’ num sentido absoluto, porque o mal é evidente na realidade que me cerca, a realidade em que eu vivo, e que para todos os efeitos é a única em que posso concretizar meu existir e meus ideais. Se estou neste mundo, partilhando desta realidade palpável e visível, dura e cruel, junto com toda a humanidade, e é somente aqui que posso interagir com o meu próximo, não posso simplesmente fechar meus olhos e tentar me convencer de que 'nada disto é real'. Nesta realidade, o mal e o sofrimento são muito reais, evidentes, estão bem diante dos meus olhos a cada momento, e é nesta realidade que eu vivo. Olho para baixo e vejo que o teclado do meu computador está sujo. Meu filho derrubou sorvete nas teclas, e as letras ‘R’, e ‘T’ estão grudentas. Outras teclas por onde os dedinhos dele deslizaram também estão manchadas. Percebo que vou ter que desmontar este teclado para limpar. Também o monitor do meu computador não está bom. Tem alguns anos de uso e começa a apresentar defeitos: a imagem treme e há variação de cores, o que atrapalha a visualização.
Além disso, por algum desses motivos que técnico algum consegue explicar, a navegação na internet anda bastante lenta nestes últimos dias, o que dificulta o meu trabalho. Penso que num mundo divino, perfeito e maravilhoso, tais dificuldades não existiriam. Mas eu vejo o meu próximo sofrendo, todos os dias, e não posso e não quero me tornar insensível a esse sofrimento, pois vejo a mim próprio (e a Deus) nos meus próximos. Se tornou um clichê dizer que “somos todos um”, mas até que ponto estamos conscientes (nós, humanidade) do significado profundo dessa afirmação? Então, percebam que não basta dizer que ‘o mal não existe’ para os que despertam da armadilha das ilusões, porque a imensa maioria de nós simplesmente não compartilha dessa percepção. Para bilhões de seres humanos ao redor deste planeta, o mal e o sofrimento não só existem como representam a única realidade que conhecem. Há algum tempo recebi um email com um filminho em slides que mostrava cenas pavorosas da fome nos países pobres da África. Havia cenas extremamente terríveis daquelas crianças famintas, com ossos visíveis por baixo da pele e moscas nos olhos. Os slides se sucediam, mostrando populações inteiras de gente faminta. Gente sem nenhum futuro. Imagens de miséria extrema, que a alguns comovem e a outros revoltam. A miséria pelo mundo, seja em Uganda, no Haiti, no sul da Ásia, no Ceará, na Índia ou em Bogotá, é massacrante. Ao final do festival de horrores daquele filme, a legenda concluía afirmando que todos nós deveríamos nos sentir muito gratos a Deus por termos o que comer, o que beber, o que vestir, quando há tantos miseráveis no mundo. Curioso, mas ver esse tipo de coisa causa um efeito completamente oposto em mim. Ver aquelas atrocidades tão cruamente expostas é uma experiência que me deixa totalmente arrasado, me afasta de Deus, me faz rever minhas certezas, questionar minhas posturas, perguntar "por que, por que, por que, por que, por que, por que..." Extraído do Arte das Artes