Alunos da Rede Publica são afetados pela Má alimentação que afeta desenvolvimento físico

Cantina fechada sem merenda, recreio perde a alegria dos estudantes da Escola Municipal Coronel Humberto Bezerra, em Abaiara (Foto: Juliana Vasquez) Descaso alimentar: sem merenda, alunos da Escola Municipal Berlamino Lins Medeiros recorrem a balas e doces vendidos por camelôs Faltando lanche: alunos disputam água na cantina da Escola Municipal João Linhares Escolas de Abaiara e Crato, no Cariri, vendem lanches e guloseimas, ao invés de oferecer a merenda escolar gratuita Abaiara. Treze anos de idade. O corpo é minguado como de uma criança de 9 anos: estatura baixa e magro. Assim é Paulo, um nome fictício de um garoto pobre, mas protagonista de uma situação real, em Abaiara, a 460 quilômetros de Fortaleza, na região Sul do Estado. O jovem cursa a 8ª série, mora na zona rural e mal se alimenta em casa para ir à escola pela manhã. Paulo convive com a subalimentação no local onde estuda. Quando não leva lanche de casa, como acontece na maioria das vezes, também não conta com a merenda escolar na unidade de ensino onde o jovem estuda. Do lugar onde mora para a Escola, Paulo fazia um percurso acima de oito quilômetros a pé. Paulo está incluído na estatística da própria escola, em que aponta cerca de 20% dos estudantes com o Índice de Massa Corporal (IMC) na linha da desnutrição. O levantamento foi feito com alunos compreendidos na faixa etária de 13 a 17 anos. Aliás, fazer um levantamento do IMC não é somente algo raro nas escolas do Interior do Estado do Ceará, como na própria Capital. Em Abaiara, a idéia partiu do professor de Educação Física, da Escola de Ensino Fundamental e Médio Berlamino Lins de Medeiros, Tonisval Nonato de Sousa.Tonisval ainda cursa Educação Física, pela Universidade Regional do Cariri (Urca). “A medida que fui aprendendo e tomando conhecimento da ciência da Educação Física, tenho aplicado esses conhecimentos nas escolas onde ensino e constatado um quadro triste”, afirma o professor. Ele reconhece ser um grande desafio fazer um planejamento de exercícios físicos com crianças e adolescentes mal alimentados. “Temos que adaptar técnicas para a realidade de nosso aluno, mas a adotada não é a mais adequada para um período de crescimento e formação física e intelectual”, disse. Na verdade, o drama de Paulo e de outros estudantes, com tamanho e peso abaixo da média, poderia ser atenuado caso a escola cumprisse sua parte: oferecer a merenda escolar. No entanto, onde ele estuda falta merenda desde o início do ano. A explicação é que não houve tempo de fazer a licitação, além da logística precária de envio de alimentos para a zona rural. Com isso, os vendedores ambulantes entram na escola durante o recreio, para vender guloseimas, como, por exemplo, chilitos, pirulitos e, para uma pequena minoria de consumidores, pão de queijo. A falta da merenda, além de estar longe de se restringir a uma escola, também faz com que se mantenha a cultura de venda de lanches ou doces, nos locais onde deveriam se preparar os alimentos. Esse é o caso da Escola de Ensino Infantil e Fundamental Coronel Humberto Bezerra. A diretora Maria Ivonete Caldas fica constrangida ao mostrar os depósitos vazios, bem como freezer que há tempos não armazena carnes e outros produtos perecíveis. As aulas começaram no dia 2 de fevereiro, mas somente no começo de maio é que a merenda chegou à escola de maneira regular. “É natural que os alunos protestem, porque muitos residem na zona rural e tanto demoram para chegar na escola, quanto para retornarem às suas casas”, afirma a diretora, Maria Ivonete.

DOENDO NO BOLSO

Abaiara perde verba do ICMS

Abaiara. Os números dos repasses do FNDE para o município de Abaiara, este ano, refletem bem a limitação de recursos destinados para a merenda escolar. De dezembro até marco deste ano, foram R$ 12.144,00 para os 101 alunos do pré-escolar; R$ 9.020,00 para 247 das creches; e R$ 64.240,00 para os estudantes do Ensino Fundamental. O atual prefeito de Abaiara, Francisco Joaquim Sampaio (PSDB), conhecido como Chico Sampaio, é agropecuarista e está no primeiro mandato. No entanto, seu antecessor, José Moreira Sampaio, é professor e foi assessor da Secretaria de Educação, antes do mandato de prefeito. Mas todo esse conjunto de fatores, conforme atesta a secretária Lúcia Maria, não concorreram para a melhoria do ensino em Abaiara. Esse quadro negativo foi verificado, especialmente, no ano passado. O município ficou entre os três piores do Estado na prova Brasil Alfabetizado, inserido no Programa Educação Idade Certa. Teve resultados críticos em 2008, somente ficando atrás da cidades de Senador Sá e Baixio. Abaiara foi uma das administrações que passou a contar com menos recursos este ano. A má aplicação no setor educacional, considerando os resultados do Programa Idade Certa, fez com que o Governo do Estado reduzisse em 36,2% o repasse dos recursos do ICMS.

Golpe duro

“Esse foi um golpe duro para a Educação. Queríamos saber onde erramos”, disse Lúcia Maria. No entanto, não acredita que somente a melhoria dos níveis de nutrição e da oferta da merenda escolar teriam contribuído para o incremento do desempenho dos alunos. Ela diz que todos os esforços estão sendo empreendidos para elevar o nível dos alunos, que passam pela regularização da oferta da merenda.

PROVINHA BRASIL

Município tem um dos piores desempenhos

Abaiara. A atual secretária de Educação de Abaiara, Lúcia Maria Cardoso de Sousa, diz que foi um momento triste o resultado da Provinha Brasil, a ponto de mexer com os brios de toda a equipe que atua no setor educacional naquele município. “Nós sabemos que estamos no município mais pobre da região, em que uma deficiência está ligada a outra e acaba repercutindo no resultado final das avaliações de nossos alunos”, afirma a secretária. Com relação à merenda escolar ela confirma que esse é o problema mais grave, envolvendo o município. A demora para se fazer uma licitação, que é um processo simples, haja vista a limitação de recursos, prejudicou a oferta este ano, o que fez com que a administração municipal, ficasse de “mãos atadas” para fazer as compras. A demora em se fazer a licitação obrigou uma inquirição da presidente do Conselho de Alimentação Escolar (CAE), Maria das Dores Evangelista. Ela esteve na Secretaria de Educação e houve a promessa de que se regularizaria ainda este semestre. Outro problema foi na incapacidade do município em oferecer uma contrapartida para os R$ 0,22 concedidos pelo FNDE, por meio do Pnae, a fim de manter a merenda escolar. Atualmente, o valor “per capita” da merenda em Abaiara fica em torno de R$ 0,18. “Os próprios técnicos do MEC (Ministério da Educação) reconheceram que não tínhamos como contribuir com recursos próprios, daí que o valor per capita da merenda chegou a ficar inferior aos R$ 0,22”, disse a secretária.
Lúcia Maria diz que é conhecedora do problema da carência alimentar dos alunos. Ela conta que, vez ou outra, um aluno chega passando mal em sua sala, por conta da fome.

CIDADE RICA

Crato tem alto índice de evasão escolar

Crato. Enquanto Abaiara se inclui entre os mais pobres, Crato, a 575 quilômetros de Fortaleza, é um dos mais ricos municípios da região do Cariri, sendo inclusive considerada uma cidade universitária. O que há em comum entre ambos são o fato de que a merenda escolar não apenas é irregular para os alunos, como há um comércio em cantinas, quando deveriam funcionar para a preparação dos alimentos gratuitos dos estudantes. A falta de merenda e comércio de doces por merendeiras foram flagrados na Escola de Ensino Infantil e Fundamental João Leandro, localizado no Sítio Boqueirão, a 26 quilômetros da sede do município.
A diretora Adriana de Sousa mostrou a dispensa, com um quantitativo irrelevante para preparar a merenda escolar: um quilo de feijão e ovos. Somente a água do filtro era oferecida gratuitamente para os estudantes da escola. “Essa é uma situação momentânea, não tem sido uma prática comum na nossa escola”, desculpa-se a diretora. Do mesmo modo, o secretário de Educação do Crato, José Valentim Dantas, comenta que a situação é de logística. Ou seja, com as chuvas, não somente tem sido difícil os estudantes se deslocarem de suas casas para as escolas, como também fazer chegar os gêneros alimentícios nas localidades mais distantes e que tem como acesso a estrada carroçal. Valentim não concorda com o comércio da merenda escolar e diz que irá manter uma fiscalização mais ostensiva, no sentido de coibir essa prática. “Sabemos que a merenda escolar é um fator importante de motivação do aluno. Mas nosso problema maior é com a gestão”, disse Valentim. Crato chama a atenção da Secretaria de Educação do Estado por estar entre os 20 municípios cearenses, de um total de 184, com maior índice de evasão, de acordo com o censo do ano de 2007.
Diario do Nordeste